Uma cultura de inclusão e pertencimento é fundamental para atrair e reter talentos diversos. No entanto, muitos executivos ainda não sabem como criá-la e mantê-la. O maior desafio é saber que ações colocar em prática para gerar pertencimento, coesão e acolhimento das equipes remotas ou híbridas.
Inclusão e pertencimento são chave na experiência do colaborador
O Employee Experience, que Denise Lee Yohn, da Revista Forbes, chamou de “a soma de tudo o que um funcionário experimenta ao longo de sua conexão com a organização”, ganhou força nos últimos anos.
Dentre os fatores que mais impactam negativamente esta conexão, bem como a inclusão e o senso de pertencimento do colaborador, segundo o estudo “2021 Global Employee Engagement Benchmark”, estão os seguintes:
- relações ruins com as lideranças,
- dificuldade de estabelecer conexões significativas,
- e ausência de senso de propósito.
Além disso, o cenário pós-pandemia potencializou o desafio da inclusão, conexão e coesão. Isso porque:
- Muitas empresas adotaram os modelos de trabalho remoto e híbrido;
- Com boa parte da força de trabalho online, a guerra de talentos se tornou global;
- Empresas que estão crescendo muito rápido não conseguem desenvolver novas lideranças em tempo hábil. Isso acaba por prejudicar o desempenho dos times e alcance das metas.
- Muitas pessoas, ao permanecer mais tempo em casa, tiveram oportunidade de perceber o desequilíbrio entre vida pessoal e profissional. Por esta razão, muitos estão pedindo demissão, mesmo sem ter outro emprego em vista.
Os líderes não entendem as razões da perda de talentos
A onda de demissões em massa começou nos Estados Unidos e chegou ao Brasil no início de 2022. Este fenômeno está exigindo que os executivos seniores entendam melhor por que seus colaboradores estão saindo. Só em fevereiro, mais de 600 mil brasileiros pediram demissão, segundo o Cadastro Nacional de Empregados e Desempregados (Caged), do IBGE.
Segundo pesquisa da Mckinsey, os três principais fatores que os colaboradores citaram como motivos para se demitirem foram:
- Não se sentem valorizados por suas organizações (54%),
- Não se sentem valorizados por seus gerentes (52%),
- Ausência de um sentimento de pertencimento no trabalho (51%). Colaboradores que se classificaram como não-brancos ou multirraciais eram mais propensos do que seus colegas brancos a dizer que haviam saído porque não sentiam que pertenciam às suas empresas.
A mesma pesquisa detectou a discrepância entre os motivos que os empregadores reconheceram para esta grande demissão e os motivos revelados pelos colaboradores.
Isso nos leva a concluir que o fato da liderança não saber quais são os principais motivos das demissões voluntárias é o maior entrave para conseguir vencer o desafio de atrair e reter talentos.
Parece evidente que os líderes estão enfrentando dificuldades em detectar as necessidades de seus colaboradores. E encontram obstáculos para adaptar a gestão do negócio e a cultura organizacional para atender a essas necessidades.
Nessas condições, as lideranças passaram a ter um papel ainda mais relevante. Elas passam a ser responsáveis por minimizar e eliminar as lacunas entre comportamentos, sistemas e práticas da cultura organizacional. E, por consequência, gerar senso de pertencimento e reter talentos.
Como os colaboradores veem o desafio da inclusão e pertencimento
Segundo a consultoria internacional Gallup, “os líderes precisam entender a implicação que a variedade demográfica tem no desempenho dos negócios e criar um ambiente que convide todo o espectro de perspectivas dos colaboradores e as maximize”.
De acordo com o Kantar Inclusion Index de 2019, primeiro índice global de D&I baseado exclusivamente em feedbacks de colaboradores de diversos setores, os brasileiros enfrentam desafios no ambiente profissional e sentem dificuldades em compartilhar os seus problemas internamente:
- Do total de entrevistados, 67% disseram não se sentir confortáveis em reportar comportamentos negativos para a liderança ou aos gestores de Recursos Humanos (RH).
- 41% afirmam que se sentiram desconfortáveis no local de trabalho no último ano.
- 35% observaram discriminação negativa em relação a outras pessoas dentro da empresa.
- 34% dizem enfrentar obstáculos em suas carreiras relacionados ao gênero, idade, etnia, orientação sexual etc.
- 28% sentem que suas empresas precisam ser mais inclusivas e diversas do que são atualmente.
- 25% responderam que foram assediados ou intimidados nos últimos 12 meses.
- 22% dos colaboradores sentem que as oportunidades não são direcionadas para as pessoas mais merecedoras.
Promover senso de pertencimento para reter talentos
Os comportamentos, sistemas e práticas são os elementos-chave da cultura organizacional. E, para que seja possível construir um ambiente de inclusão e pertencimento, é preciso alinhar esses três elementos entre si. Só então é possível alinhá-los aos valores da Organização.
Alicerçado nisso, é possível fomentar o alinhamento dos valores do colaborador com os que são praticados na empresa. Afinal, não basta ter uma linda carta de valores na parede, se ela não estiver expressa nas ações do dia a dia.
Como criar um ambiente inclusivo
Para que os colaboradores tenham um comportamento inclusivo, os líderes precisam ser exemplo. Além disso, é preciso treinar suas equipes para estarem abertos às diferentes perspectivas do time. Esta diversidade de opiniões é um valor imprescindível para o grupo inovar e prosperar.
Está claro que é preciso criar um ambiente confiável, no qual os colaboradores sintam que:
- são ouvidos,
- estão conectados aos valores da empresa e,
- contribuem para o crescimento do negócio.
Segundo o Guia Salarial 2022, da Robert Half Talent Solutions, as empresas que investem em práticas de inclusão e equidade são melhores na resolução de problemas, tomadas de decisão e inovação.
O relatório afirma que a inclusão ocorre quando as pessoas:
- sentem-se seguras e apoiadas para serem elas mesmas no trabalho.
- são tratadas de forma justa e têm acesso a iguais oportunidades para avançar na empresa.
- são uma parte reconhecida e valorizada da equipe, independentemente de sua origem ou função.
- têm uma voz e sabem que são ouvidas.
O que significa senso de pertencimento no trabalho?
Segundo um relatório da Coqual, uma consultoria internacional sem fins lucrativos, “o senso de pertencimento no trabalho significa que você é reconhecido por suas contribuições únicas, conectado com seus colegas, apoiado em seu trabalho diário e desenvolvimento de carreira, e orgulhoso do propósito e dos valores da sua organização”.
De acordo com o relatório, o senso de pertencimento é definido por 4 elementos principais:
- Seen (Reconhecido) – quando você é reconhecido no trabalho, você é recompensado e respeitado pelos seus colegas.
- Connected (Conectado) – quando você está conectado com o trabalho, você tem interações sociais autênticas e positivas com os colegas, gerentes e diretores.
- Supported (Apoiado) – quando você recebe apoio no trabalho, aqueles à sua volta – desde os colegas de equipe até os líderes sênior – isso te dá o que você precisa para fazer seu trabalho e viver uma vida plena.
- Proud(Orgulhoso) – quando você se orgulha do seu trabalho e de sua empresa, você se sente alinhado com seu propósito, visão e valores.
Desafios da liderança para uma cultura de inclusão e pertencimento
O relatório Tendências de Gestão de Pessoas em 2022 revelou a relevância do desenvolvimento das lideranças para a inovação. Este é um dos principais fatores para as empresas se adaptarem e prosperarem num mercado em constante mudança.
“Quando questionadas sobre o principal empecilho para a inovação nas empresas, a maioria das pessoas (37,1%) respondeu “mentalidade da liderança”, assim como no ano anterior, quando 32% das pessoas apontaram o mesmo obstáculo. Ou seja, pelo que tudo indica, ainda há uma discrepância entre a liderança necessária para 2022 e a liderança existente.”
Esses e outros estudos nos trouxeram indícios de que as habilidades mais relevantes para reter talentos, criar um ambiente seguro para inovar, e fazer o negócio crescer são justamente as mais comuns na liderança humanizada. Segundo uma pesquisa da Mckinsey, sobre comportamentos de liderança mais eficazes para enfrentar os desafios futuros, essas habilidades são:
- inspiração,
- tomada de decisão participativa,
- estabelecimento de expectativas e recompensas e,
- desenvolvimento de pessoas e modelagem de papéis.
Saber ouvir e colaborar começaram a ser apreciados pelas organizações, embora o comportamento mais comum ainda seja a tomada de decisão centralizada, o controle e a punição dos erros.
É disso que se trata o futuro do trabalho:
- colaboração,
- senso de pertencimento,
- resiliência, adaptabilidade e,
- desenvolvimento de pessoas e relações.
E é por isso que investir no desenvolvimento da liderança passa a ser tão fundamental para prosperar no cenário que emerge.
Como desenvolver líderes aptos a criar uma cultura de inclusão e pertencimento
Segundo a consultoria internacional Gallup, “para obter as vantagens de uma força de trabalho diversificada e inclusiva, os líderes precisam primeiro definir o que a diversidade significa para sua cultura única e como eles esperam que a inclusão se manifeste em suas equipes. Em seguida, eles devem ter dados objetivos para indicar se são diversos e inclusivos”.
A partir da definição do que é inclusão e pertencimento em sua empresa, e do alinhamento de valores entre empresa e colaboradores, é possível reconhecer os gaps de habilidades na liderança para que implementar ações deste gênero seja possível.
A Mckinsey descreve seis comportamentos que definem lideranças inclusivas:
- Garantir que os membros da equipe se manifestem e sejam ouvidos;
- Tornar seguro propor novas ideias;
- Capacitar os membros da equipe para tomar decisões;
- Receber conselhos e implementar feedback;
- Dar feedback acionável;
- E dividir o crédito pelo sucesso da equipe.
Segundo o estudo, “dos colaboradores que relatam que seu líder de equipe possui pelo menos três dessas características, 87% dizem que se sentem bem-vindos e incluídos em sua equipe, 87% dizem que se sentem à vontade para expressar suas opiniões e 74% dizem que sentem que suas ideias são ouvidas e reconhecidas. Para os entrevistados que relataram que seu líder de equipe não tem nenhuma dessas características, essas porcentagens caíram para 51%, 46% e 37%, respectivamente”.
Inclusão requer ousadia da liderança
Esses dados mostram o papel crítico da liderança em construir culturas de inclusão e pertencimento, o que Brené Brown chama de liderança ousada, em seu livro Coragem para liderar. A autora afirma que, para criar culturas de inclusão, “precisamos de líderes mais destemidos e culturas mais corajosas”. Esta foi a resposta comum de diversos líderes (C-Level) quando perguntados “o que precisa mudar na forma como as pessoas estão liderando hoje para que os líderes tenham sucesso num ambiente complexo e em rápida transformação no qual enfrentamos desafios aparentemente insuperáveis e uma demanda insaciável por inovação?”.
Com base em mais de 20 anos de pesquisa, a professora e pesquisadora da Universidade de Houston, desvendou quatro grupos de habilidades que constróem uma liderança destemida:
- Encarar a vulnerabilidade
- Viver de acordo com nossos valores
- Desafiar a confiança
- Aprender a crescer
Habilidades de uma liderança inclusiva
Uma liderança capaz de fomentar uma cultura de inclusão e pertencimento precisa desenvolver habilidades que lhe permitam criar um ambiente acolhedor para os membros de equipe se manifestarem, serem ouvidos, propor novas ideias, tomarem decisões, dar e receber feedbacks e onde o crédito pelo sucesso é compartilhado com a equipe.
Veja quais são as habilidades mais importantes para um ambiente de inclusão e pertencimento.
Autopercepção (interna e externa)
Capacidade de ter clareza sobre seus valores, aspirações, reações, forças e fraquezas, pensamentos, sentimentos e comportamentos e o impacto disso nos outros; bem como a habilidade de identificar como as outras pessoas o veem.
Presença
Habilidade de silenciar pensamentos relacionados ao passado e ao futuro e dedicar plena atenção à atividade que realiza no presente. Inclusive aumentando, assim, sua capacidade de percepção do outro e de como suas ações impactam no ambiente à sua volta.
Empatia (saber ouvir)
Conseguir colocar-se na perspectiva do outro para compreender seus sentimentos, pensamentos, comportamentos e necessidades em relação ao trabalho. E estar sempre aberto a ouvir o que os membros da equipe têm a compartilhar.
Apreciação
Ser capaz de apreciar o que cada membro da equipe traz de valor para o time e para o trabalho.
Vulnerabilidade
Estar disposto a ser exemplo de vulnerabilidade, demonstrando que o ambiente de trabalho é seguro para compartilhar ideias inovadoras, arriscar-se e expor seus sentimentos em relação ao trabalho.
Timing
Saber o tempo de cada processo e respeitar o ritmo de cada pessoa, contribuindo para que todos sigam num processo de constante aprendizado e aprimoramento, bem como de participação no trabalho e na cultura organizacional.
Estabilidade emocional
saber manter a serenidade e a confiança diante de cenários e circunstâncias caóticas e, assim, ter clareza mental para tomar melhores decisões.
Atitude otimista
Buscar sempre novos aprendizados para solucionar os desafios e dificuldades, ao invés de encontrar culpados e puni-los por seus erros. Foco em desenvolver as habilidades que faltam nos liderados ao invés de transformá-los em vilões dentro da equipe.
Sentir-se parte do seu time de trabalho é uma das necessidades mais fundamentais do ser humano, considerando que dedicamos à profissão a maior parte dos nossos dias. E isso é resultado de programas de inclusão e pertencimento bem construídos como mencionei antes, e de uma liderança em constante treinamento e desenvolvimento, para fomentar um ambiente de trabalho mais seguro, amigável, em que há interesse real na perspectiva de todos e que toda contribuição tem valor para as decisões da equipe.